domingo, 10 de outubro de 2010

Frei Betto escreve na Folha de São Paulo sobre Dilma e a fé cristã




Foto: camacarifatosefotos.com.br


Em tudo o que Dilma realizou, falou ou escreveu, jamais se encontrará uma única linha contrária aos princípios do Evangelho e da fé cristã


Conheço Dilma Rousseff desde criança. Éramos vizinhos na rua Major Lopes, em Belo Horizonte. Ela e Thereza, minha irmã, foram amigas de adolescência. Anos depois, nos encontramos no presídio Tiradentes, em São Paulo. Ex-aluna de colégio religioso, dirigido por freiras de Sion, Dilma, no cárcere, participava de orações e comentários do Evangelho. Nada tinha de "marxista ateia".

Nossos torturadores, sim, praticavam o ateísmo militante ao profanar, com violência, os templos vivos de Deus: as vítimas levadas ao pau-de-arara, ao choque elétrico, ao afogamento e à morte.

Em 2003, deu-se meu terceiro encontro com Dilma, em Brasília, nos dois  anos em que participei do governo Lula. De nossa amizade, posso assegurar que não passa de campanha difamatória - diria, terrorista - acusar Dilma Rousseff de "abortista" ou contrária aos princípios evangélicos.

Se um ou outro bispo critica Dilma, há que se lembrar que, por ser bispo, ninguém é dono da verdade. Nem tem o direito de julgar o foro íntimo do próximo.


Dilma, como Lula, é pessoa de fé cristã, formada na Igreja Católica. Na linha do que recomenda Jesus, ela e Lula não saem por aí propalando, como fariseus, suas convicções religiosas. Preferem comprovar, por suas atitudes, que "a árvore se conhece pelos frutos", como acentua o Evangelho.


É na coerência de suas ações, na ética de procedimentos políticos e na dedicação ao povo brasileiro que políticos como Dilma e Lula testemunham a fé que abraçam.

Sobre Lula, desde as greves do ABC, espalharam horrores: se eleito, tomaria as mansões do Morumbi, em São Paulo; expropriaria fazendas e sítios produtivos; implantaria o socialismo por decreto...

Passados quase oito anos, o que vemos? Um Brasil mais justo, com menos miséria e mais distribuição de renda, sem criminalizar movimentos sociais ou privatizar o patrimônio público, respeitado internacionalmente.


Até o segundo turno, nichos da oposição ao governo Lula haverão de ecoar boataria e mentiras. Mas não podem alterar a essência de uma pessoa. Em tudo o que Dilma realizou, falou ou escreveu, jamais se encontrará uma única linha contrária ao conteúdo da fé cristã e aos princípios do Evangelho.

Certa vez indagaram a Jesus quem haveria de se salvar. Ele não respondeu que seriam aqueles que vivem batendo no peito proclamando o nome de Deus. Nem os que vão à missa ou ao culto todos os domingos. Nem quem se julga dono da doutrina cristã e se arvora em juiz de seus semelhantes.

A resposta de Jesus surpreendeu: "Eu tive fome e me destes de comer; tive sede e me destes de beber; estive enfermo e me visitastes; oprimido, e me libertastes..." (Mateus 25, 31-46). Jesus se colocou no lugar dos mais pobres e frisou que a salvação está ao alcance de quem, por amor, busca saciar a fome dos miseráveis, não se omite diante das opressões, procura assegurar a todos vida digna e feliz. Isso o governo Lula tem feito, segundo a opinião de 77% da população brasileira, como demonstram as pesquisas. Com certeza, Dilma, se eleita presidente, prosseguirá na mesma direção.

FREI BETTO, frade dominicano, é assessor de movimentos sociais e escritor, autor de "Um homem chamado Jesus" (Rocco), entre outros livros. Foi assessor especial da Presidência da República (2003-2004, governo Lula).

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Touros carece de líderes políticos


Bandeira do município de Touros


Após a Assembléia Constituinte de 1988, o primeiro prefeito eleito no município de Touros, para a gestão 1989/1992, foi o ex-secretário de Administração da gestão Pedro de Andrade Ribeiro, Carlos Alberto Câmara de Carvalho, o Carlão.

Carlão, a princípio, estava ligado ao grupo que havia fundado o Partido Socialista Brasileiro – PSB, no município, o professor João Bosco Teixeira e este articulista. As articulações eram construídas em torno da candidatura dele, Carlão, para prefeito de Touros, pela sigla socialista, o que não ocorreu, saindo o ex-secretário municipal candidato a prefeito pelo Partido Liberal – PL, do ex-deputado federal Flávio Rocha. Mesmo com essa demonstração de fisiologismo político, o candidato obteve o apoio da sigla socialista, chegando ao poder municipal nas eleições de 1988, pela maioria dos votos dos tourenses, fruto do carisma que transmitia ao eleitorado.

Apesar dos compromissos assumidos em prol de uma administração voltada para o interesse dos menos favorecidos socialmente, não foi o que ocorreu no decorrer da gestão, tornando-a apática; o que descambou para o impeachment ocorrido no início de 1992, com o apoio do PSB, que antes apoiava Carlão, assumindo o vice, Josemar França.

Historicamente em Touros, os que se acham lideranças políticas no município, costumam construir as suas carreiras alicerçadas no sobrenome familiar, com uma administração focada no patrimonialismo e no nepotismo, tentando passar o poder de pai para filho, e quando muito as realizações são obras físicas, deixando para segundo plano uma administração calcada na qualidade da educação, saúde e investimentos na qualificação profissional dos munícipes, desfavorecendo o crescimento do Índice de Desenvolvimento Humano – IDH, do município.

Pode-se dizer que os únicos dois momentos da história política recente de Touros em que os candidatos a prefeito não tiveram origem na tradição política familiar, foram a eleição de Carlão, em 1988, e a candidatura de Cesar José de Oliveira, pelo Partido dos Trabalhadores – PT, no ano 2000, quando foi oferecida à população, a oportunidade de votar em um candidato originário dos movimentos sociais ligados aos trabalhadores do campo.

Não há pecado em pertencer a famílias tradicionais e exercer a política partidária. O pecado reside no fato de transformar o partido político em uma agremiação familiar e o poder executivo em uma plataforma para suceder a parentada a cada eleição. Afinal, já dizia o filósofo que o homem é um animal político.

Contrastando essa análise das “lideranças” tourenses com as características inerentes a um líder: motivação para uma causa, investimento na formação de outros líderes, carisma, habilidade de negociação ouvindo as outras pessoas e foco nos objetivos, percebemos que esses traços não são característicos dos que se acham líderes políticos no município de Touros.

Geralmente, terminado o processo eleitoral, esse “líderes” somem do município, sem uma inserção no dia a dia da comunidade para o debate dos problemas existentes, tentando encontrar saídas e soluções.

Faz-se urgente uma reforma política no Brasil, que se traduza em menor número de partidos com maior nitidez ideológica, e que permita o surgimento de novas lideranças políticas, advindas dos movimentos sociais e inseridas no dia a dia da comunidade (professores, pescadores, agricultores, profissionais liberais, funcionários públicos, estudantes, etc) e não “líderes” fabricados em práticas políticas tradicionais que somente garantem a sustentação, no poder público, dos defensores do patrimonialismo e do nepotismo.